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ENTENDENDO “NÓS MATAMOS O CÃO TINHOSO!” (Luís Bernardo Honwana)

Foto do escritor: Ludmila Ribeiro de MelloLudmila Ribeiro de Mello

Quem é Luís Bernardo Honwana? (1942 - presente)

 

Luís Bernardo Honwana nasceu em Moçambique, onde atuou como jornalista, escritor e também foi um ativista político em seu país, saindo em defesa da independência de sua nação em relação a Portugal. Por essa mesma razão, foi preso em 1964, mesmo ano do lançamento do aclamado “Nós matamos o cão tinhoso”. Após conquistada a independência de Moçambique, Luís Bernardo Honwana atuou como presidente da Organização Nacional dos Jornalistas de Moçambique. Já em 1991, fundou o Fundo Bibliográfico de Língua Portuguesa e em 1994 foi convidado para ser diretor do escritório geral de regionalização da UNESCO e para participar do secretariado da organização. É membro fundador da Organização Nacional dos Jornalistas de Moçambique, da Associação Moçambicana de Fotografia e da Associação dos Escritores Moçambicanos.

 

Contexto histórico-literário:

         

O livro “Nós matamos o cão tinhoso!” foi publicado a primeira vez em 1964, em uma edição original moçambicana e consegue traçar de forma clara uma sociedade cruel, dominada pelo racismo e pela injustiça social. Em uma Moçambique ainda pertencente a Portugal, conhecemos através dos contos, a brutalidade do sistema colonial para os mais desfavorecidos, como mulheres e crianças.

              

“Nós matamos o cão tinhoso!” (1964) – sinopse

         

          O livro foi originalmente composto por sete contos, mas hoje conta com oito (inclusão de Rosita, Até Morrer, de 1971), todos com histórias independentes, mas que conversam de alguma maneira entre si. O principal deles é, claro, o que dá nome ao livro “Nós Matamos o Cão Tinhoso!” O livro é uma grande denúncia social contra a opressão colonial portuguesa, o racismo e a discriminação contra as mulheres e a cultura local.

“Em Nós Matamos o Cão Tinhoso!, temos a escola como um espaço em que a desigualdade se configura e reflete a penetração do sistema colonial em todos os níveis. A história nos traz o questionamento do narrador Ginho e também da aluna Isaura, “que não brincava com as outras meninas”. Eram os únicos da escola a darem atenção para o cão. A violência e a opressão vão crescendo até que os garotos recebem a incumbência de matar o Cão Tinhoso (tinha = doença).

O segundo conto, Inventário de Imóveis e Jacentes, traz o universo familiar que permite acompanhar, pela descrição da casa, a precariedade material que definia o ambiente dos colonizados.

Em Dina, terceiro conto, o mundo do trabalho é abordado e esse espaço surge especialmente tocado pela vulnerabilidade da mulher, que é abusada pelo capataz em uma simbologia do abuso da metrópole versus colonizados.

          O conto seguinte, Papa, cobra e eu, fala sobre a cumplicidade entre um pai e seu filho na reação contra o domínio português.

          Já o conto As mãos dos pretos é uma clara crítica ao racismo. A história nos ajuda a compreender melhor como o preconceito racial é disseminado a partir de ditos populares ou concepções produzidas por pessoas de diversas posições sociais, interrogadas por um garoto que se sente incomodado pelo fato de as palmas das mãos dele serem brancas.

A velhota é um conto que trata da pobreza e miséria social sob o sistema colonial em Moçambique e apresenta um diálogo entre um narrador assimilado e um soldado colonial branco.

O último conto da obra original, Nhinguitimo ou vento sul, na língua ronga, são ventos que antecipam a chegada do Verão. A história denunciou a exploração que serviu de estímulo à revolução. Mostra a revolta e a resistência individual frente aos desmandos de um sistema colonial injusto.


O que é importante saber?

 

É importante estar atento às críticas espalhadas pelos contos, como o racismo, a violência contra a mulher, o anseio por liberdade e a opressão imposta aos dominados. E como tudo isso pode ser associado ao que vivemos hoje, fazendo ligações e contrapontos com obras mais atuais ou com fatos históricos, como sistema colonial brasileiro. É inegável a relação dessa obra com a de Cecilia Meireles, O romanceiro da Inconfidência, sendo que ambas apresentam a visão do colonizado perante o colonizador.

Segundo a professora Rita Chaves, do departamento de letras clássicas da USP, o livro sugere “Para além dos efeitos materiais, o grau de desigualdade que vigora, e vem crescendo, deve ser observado também como um terrível problema ético. O absurdo dessa disparidade que nos ameaça impede que se possa falar no fim do colonialismo, embora os países africanos, por exemplo, tenham ficado independentes no decorrer do século 20. Efetivamente, nós não conseguimos vencer as suas consequências. As sombras do sistema colonial estão espalhadas pelo planeta. Elas se projetam nas estatísticas da fome e dos desastres humanitários, na superpopulação das prisões em países subdesenvolvidos e nos naufrágios com barcos de refugiados noticiados todas as semanas.” Rita ainda assevera: “Um livro como esse, de um autor de Moçambique, um dos países mais pobres do mundo, nos traz uma realidade que, embora pareça distante, convive conosco, com muitos pontos de semelhança com qualquer cidade brasileira. Ginho, o menino sofrido de Nós Matamos o Cão Tinhoso!, pode ser encontrado em muitas das nossas ruas”.

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