Quem foi Dyonelio Machado? (1895 – 1985)
Dyonélio Tubino Machado começou a vida como vendedor e balconista, formou-se em medicina com doutorado em psiquiatria, mas foi como romancista e contista que ficou conhecido. A estreia literária ocorreu em 1927, com os contos de Um Pobre Homem. Contudo, é apenas em 1934 que ele escreve sua obra- prima Os ratos, com a intenção de participar de um concurso literário, no qual fica entre os quatro primeiros colocados. No ano seguinte, é preso por questões políticas e se filia ao partido comunista, fato este que irá influenciar em sua escrita. Após várias decepções envolvendo política e literatura, opta por focar na medicina retornando ao mundo literário apenas na década de 1960 quando a obra “Os ratos” é reeditada.
Contexto histórico-literário: Os ratos
A obra em questão é escrita e publicada na segunda fase do Modernismo brasileiro, aquela na qual os destaques são a reflexão acerca dos conflitos existenciais e os problemas contemporâneos. Na prosa, o regionalismo também vem deixar a sua marca. Nesta fase de consolidação do movimento modernista, há a concretização e afirmação dos novos valores modernos trazidos pelos primeiros modernistas. Assim, a quebra da forma tradicional da escrita é algo que se vê de forma recorrente e é o que ocorre com a obra analisada, na qual as categorias de tempo e espaço são trabalhadas à exaustão. O governo de Vargas, a ascensão e queda do partido comunista e a segunda guerra mundial também permeiam as escritas dos romancistas deste período trazendo às obras, muitas vezes, um aspecto denso, pessimista e perturbador.
“Os ratos” (1935) – sinopse
Mais uma vez, o fio condutor da narrativa é algo simplório e fácil de entender: acompanhamos o protagonista, Naziazeno, em sua rotina de 24 horas em busca de dinheiro para quitar uma dívida com o leiteiro.
Contudo, as horas deste dia parecem intermináveis quando o autor retrata em 28 capítulos, toda a angústia, o desespero e a humilhação do protagonista para conseguir esse dinheiro. O importante é a maneira como a narrativa se dá, através do drama psicológico do personagem principal em sua odisseia para pagar a dívida de 53 mil-réis.
Naziazeno pensa em solicitar ao Diretor da repartição onde trabalha, senhor Romeiro, que já o socorreu outras vezes quando seu filho estava doente, mas não o encontrou. Contudo, seu colega Alcides se propõe a ajudá-lo e disse-lhe para procurar o Andrade que lhe devia uma comissão. Após andar sob o sol por vários quarteirões e chegar à casa de Andrade, corretor da rua quinze, este lhe disse que não devia nada ao Alcides e que ele recorresse ao subgerente do New York Bank, pois ele é quem devia lhe pagar a comissão. Naziazeno vai embora frustrado e com fome, pois já passava da hora do almoço e ainda não tem uma solução para seu problema. Entra, então, em uma roda viva, na qual um colega o manda a outro lugar para obter dinheiro e ele sai sempre frustrado. Quando finalmente consegue algum dinheiro, ele o perde em um jogo de aposta. No auge de seu desespero, Naziazeno consegue penhorar uma joia de um amigo e resolve seu problema temporariamente. Compra presentes para a esposa e Mainho, seu filho, e vai para casa no início da noite. Após o jantar, ele se deita, mas não consegue dormir e pensa em ratos roendo seu dinheiro. Sua frio, pois ele tem a certeza de novas inquietações e angústias, pois ao amanhecer, ele se deparará com as mesmas preocupações e dívidas e, ao iniciar outro dia, caminhará em busca de uma nova solução para a atual dívida.
O que é importante saber?
É clara dentro da obra a influência do psiquiatra Dyonélio Machado, uma vez que, o ponto forte da narrativa se dá no acompanhamento psicológico que fazemos da personagem principal, Naziazeno: suas angústias (como pagar a dívida), seus pensamentos (a quem pedir dinheiro), seus medos (deixar o filho sem leite), suas necessidades básicas que transformam suas características (fome, medo) e seus impulsos (jogar para tentar ganhar mais).
O autor usa do personagem para mostrar-nos como o dinheiro move tudo, como nos perdemos em busca dele todos os dias, como isso nos consome, em uma clara crítica ao capitalismo, Dyonélio quer provar que o ser humano se dissolve diante das necessidades básicas. Como toda grande obra, a maneira como a história é contada vale tanto quanto aquilo que é contado.
Como obra filha do Modernismo, a linguagem é objetiva, simples, sem sentimentalismo, direta focando apenas na angústia do personagem em um misto de discurso direto e indireto livre.
E, por último, lembre-se do nome do livro e das cenas finais: os ratos. O sonho que consome o protagonista é de ratos corroendo seu dinheiro. Dinheiro, aliás, que ele nem tem. Os ratos podem representar o capitalismo dentro da obra: nos consome, nos impulsiona e nos faz temer perder algo que, às vezes, nem sequer temos.
Obra disponível em: Domínio Público - Detalhe da Obra (dominiopublico.gov.br)
Commentaires